Infelizmente, hoje, nesta sexta-feira treze, do mês de agosto, terei que entrar na energia vigente e registrar como de fato "a bruxa está solta". Claro que isso não se compromete a necessariamente este dia, este mês do ano, mesmo que muitos ainda acreditem nesta fama. Na realidade, pra mim, toda esta reflexão começou ontem, exatamente às 7h30, na avenida Bento Gonçalves, em frente à Igreja São Jorge, em Porto Alegre.
Logo cedo, dia nublado, ônibus lotado, a rotina comum dos trabalhadores e estudantes. Sono, cansaço, mentes distraídas, impactadas pela imagem fria e chocante do corpo de um jovem estendido na pista do corredor de ônibus, mutilado por sua velocidade avassaladora.
Mais uma vítima atropelada no trânsito frenético das vias urbanas. Um retrato aterrorizante da realidade, uma vida cheia de sonhos e expectativas, interrompida na contraditória "faixa de segurança". Um perfil lamentável.
Lá estava o jovem professor que trabalhava com educação especial, que, como todos, seguia sua rotina sem imaginar que a morte estava a sua espera, logo no local onde passara inúmeras vezes.
Por outro lado, a face de um motorista em estado de choque, fadado ao eterno sentimento de culpa. Um ponto final em duas vidas.
Fui uma entre as "testemunhas" que se deparou com esse triste e surpreendente acidente matinal. Diante disto, fui incontrolavemente submetida a uma reflexão, que a música da banda Papas da Língua levanta com perfeição."Números, números, números, o que é, o que são, o que dizem sobre você?"
Ali se encontrava mais um corpo entre muitos "colhidos" em um só dia. Ali estava mais um número que soma incontáveis e frequentes tragédias, prováveis, infelizes e para poucos inesquecíveis na história.
Me senti incompatível com minha missão profissional. Meu sentimento de solidariedade e desejo de compromisso social foi posto à prova quando percebi que para mim, meus objetivos ultrapassavam a iniciativa de informar e remeter a números que ao mesmo tempo que noticiam, anulam.
Então aqui, acima de todos os acontecimentos, não irei aderir à frieza alcançada pela maioria dos meus companheiros de profissão, que com o decorrer da carreira, tratam os incidentes do dia-a-dia como corriqueiros e normais. Me senti consideravelmente abalada e assim declaro meu imenso respeito aos familiares, amigos e alunos, que agora compartilham a dor desta lamentável perda. E ressalto, que não foi nem ao menos necessário conhecê-lo para admirá-lo como um grande perfil de Ser Humano.
Abaixo segue um trecho humanizado da notícia veiculada pela Zero Hora:
André Lucas Silveira da Rosa, 23 anos, atropelado por ônibus em Porto Alegre, foi a milésima vítima do trânsito no RS em 2010.
“Pais foram buscar seus filhos, que choravam pela morte do “professorzinho”, apelido carinhoso devido à juventude de André. Professoras estavam em lágrimas pelo “mascote”, o caçula que se dedicava ao ensino de deficientes por ideal. Ele se formou em Pedagogia na PUCRS, em 2008, optando pela educação especial.
Na Escola Dr. João Alfredo, ontem, a mesa de André, enfeitada com revistas de quadrinhos do Superboy e da família do Pato Donald, permaneceu vazia. No quadro-negro da sala de aula, uma equação matemática – quanto é 12 + 7 – deverá ser respondida pelo próximo mestre.”